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“Não é uma história particular, é um momento histórico”

Após conversa informal com a jornalista Gabriela Sobral – pessoa maravilhosa e uma das minhas melhores amigas –, decidi convidá-la para escrever um pouco do que ela me disse aqui no blog. Ela me fez pensar em um nível mais particular sobre a importância de políticas multiplicadoras, ou seja, que capacitam e empoderam as pessoas e permitem que essa capacitação e empoderamento possam ser repassados. Porque não dá para centralizar poder e dinheiro em uma mão só ou pensar apenas em ensino técnico a fim de se ter uma mão de obra mais qualificada. Precisamos transformar as pessoas em personagens principais das próprias vidas. Outro aspecto interessante que ela abordou é o fato de que temos sim que botar para fora as nossas ideias, debater. Conhecimento é uma coisa que a gente constrói coletivamente e, enquanto mulheres, somos treinadas a achar o que a gente pensa irrelevante. Não é.

Esse é um texto pessoal em um blog pessoal, então caso esperem uma análise política bem técnica, não vai ser aqui, nesse post. E embora eu tenha críticas ao governo atual, como todo mundo (/serracomedor, sdds eleições 2010), acredito que dentro das nossas escolhas atuais, o prosseguimento dele é ideal para a continuação da construção de uma sociedade mais justa. E vamos torcer para que os debates só cresçam e na próxima vez, o poder legislativo eleito no Brasil seja menos triste, conservador, religioso, militar, empresário, zuero, machista, homofóbico, etc.

Fiquem com o texto de Gabriela:

As eleições chegaram e agora já, quase, passaram. Parafraseando Drummond, foram tempos de partidos, foram tempos de mulheres e homens partidos. Contudo, ninguém pode negar que o debate é mais que salutar (claro, aquela conversinha coerente e não o discurso de ódio como vemos na maioria das vezes). Debatendo, você não só afirma os preceitos democráticos, coloca-se na esfera de debate, vê-se como parte da sociedade civil, como também passa a refletir sobre coisas que você acredita, mas que ficavam silenciadas. Por isso, hablar é importante para que sua voz ganhe legitimidade, mesmo que seja ali naquele bolo com café ou no sanduba nojento com a amiga. Ninguém precisa estar na Globo. Acredite, é nos micro espaços que ocorrem as transformações.

Suas percepções políticas se constroem por motivações culturais e pelo conhecimento adquirido, nas instituições rígidas como a escola, universidades ou na convivência familiar, no vai e vem da rua mesmo. O importante é você usar suas experiências, colocando-se num todo, pois é na coletividade que se produz os grandes arranques sociais. Por isso, coloque o seu discurso na roda, nada de risinhos e acenos de sim com a cabeça. Fale! Só assim criamos novos espaços de discussão e legitimamos nossas causas.

Eu respeitei muito isso, nessas eleições, abstive-me algumas vezes, preguiça mesmo. Outras tive que respirar fundo e ir adiante. Não foi fácil ouvir referências à presidenta Dilma como “vagabunda”, “safada”, “cachorra”. Essa misoginia me deixava doente, triste de verdade. Pensava como uma mulher presa e torturada, em um dos períodos mais cruéis, pode ser chamada assim.

Por isso, decidi trazer as coisas nas quais acredito; a minha história de vida para o contexto no qual estou inserida, pois o debate, o lugar da fala é o lugar da construção simbólica, na qual temos que buscar nossa representatividade. Olhando sempre para o lado, analisando sempre o contexto social, pois é nele que se dá a vida. Claro que as criações artificiais são importantes e a questão econômica mais importante ainda. Contudo, acredito que as políticas sociais – isso quer dizer políticas que têm um caráter de alcance e transformação na vida social e não só em termos estruturais – equalizam outras tantas questões que fogem às análises tecnicistas.

Essa coisa de olhar pra fora, de se retroalimentar das experiências, como forma de perceber o que anda acontecendo, eu aprendi desde criança. Minha mãe sempre foi professora. Mas foi graças à expansão e revitalização do ensino universitário, iniciado no governo Lula, que ela pode fazer mestrado e depois prestar concurso para graduação em letras libras na Universidade Federal do Pará. Isso, é claro, melhorou nossa vida financeira, mas melhorou ainda mais a vida da minha mãe, a minha vontade de também me qualificar, a autonomia dela, que, hoje, chefia a faculdade de línguas modernas e estrangeiras da UFPA. Além disso, pude escolher onde estudar, vim morar em Brasília, hoje curso um mestrado profissional, no IPHAN, que também faz parte das novas políticas. Enfim, tive oportunidades imensas, não só porque minha mãe se beneficiou, mas porque houve um investimento no ensino público e porque eu estava imersa em um momento de produção de conhecimento, de auto estima, de mudanças, de um um presente bom e palpável e um futuro a vir .

As políticas públicas são feitas a partir do princípio das escolhas drásticas, no caso, reestruturar o ensino superior. Com isso, não é só a Liza que passa a ser uma funcionária pública e ganhar mais, são os filhos da Liza que passam a ter mais condições de investir em suas carreiras, o filho da Liza que passa a ver a mãe (mulher) como chefe de família, a filha que recupera a tranquilidade e passa a investir na sua vida, a Liza que pode ajudar o neto, a Liza e todos e todas que a cercam passam a viver um momento histórico/social de desenvolvimento pessoal e material. Não é uma história particular, é um momento histórico.

Acho que o discurso do “vamos cortar gastos”, “vamos enxugar a máquina pública”, “a máquina está inflada” é reducionista. O aumento de programas sociais, a criação de programas e políticas públicas requerem uma estrutura burocrática mínima. O Ministério da Justiça, por exemplo, que, antes, só cuidava das suas ações básicas passar a ramificar a sua atuação para alcançar a sociedade civil.

Não funcionando como uma estrutura hermética, mas uma estrutura que incorpora e chega às pessoas. Hoje, ampliou-se as ações da comissão de anistia, com isso criou-se o movimento da comissão da verdade, o ministério passa a ter uma política efetiva contra o tráfico humano. Enfim, para isso, sim, os ministérios vão inflar, crescer. As políticas econômicas tem que ser contempladas? Óbvio. Mas atentemos para esse discurso do corte. Pois, a longo prazo, as políticas sociais que transformam uma sociedade.

Tudo isso mostra que minha história pessoal influi no meu voto? Sim. E isso é bom, pois mostra o quanto eu sou preenchida pelas minhas experiências. Aquele que diz em afastamento ou isenção, parece-me vazio. Agora, isso não significa individualismo. Pelo contrário, foi pela minha vivência e, principalmente, pela trajetória da minha mãe que pude aprender a colocar a Gabriela na prática social e aprender a ver o todo.

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Aborto no Brasil: já passou da hora do assunto ser levado a sério

Leia matéria que a Agência Brasil publicou nesta terça-feira:

Quadrilhas envolvidas com abortos chegavam a lucrar R$ 300 mil por mês

A Polícia Civil do Rio de Janeiro desarticulou hoje (14) sete organizações criminosas envolvidas com a prática ilegal de abortos na cidade. Uma delas chegava a lucrar até R$ 300 mil por mês. Segundo o delegado Felipe Bittencourt, da Corregedoria da Polícia Civil, os grupos eram independentes, mas a colaboração entre eles evitava a competição.

Apesar de não terem comando unificado, os grupos respeitavam os territórios de atuação definidos para cada um. Alguns dividiam os bairros de Bonsucesso, Rocha e Tijuca, na zona norte. Outros dois atuavam em Campo Grande e Guadalupe, na zona oeste. Os demais comandavam a prática em Copacabana e Botafogo, na zona sul. Conforme o delegado, 75 pessoas acusadas de integrar as associações criminosas tiveram prisão preventiva decretada pela Justiça.

“O histórico dessas pessoas demonstra que ela atuavam há muitos anos. Alguns haviam sido indiciados na década de 60. É uma história de crimes e de impunidade. Deflagramos hoje uma ação que desmantela vários crimes. A legislação é muito benevolente. Podemos quase afirmar que, pelo retorno financeiro, vale a pena cometer esse crime”, salientou o chefe da polícia fluminense, Fernando Veloso.

Até as 11h30 de hoje, 56 mandados de prisão tinham sido cumpridos. Destes, cinco eram de pessoas que já estavam presas. Entre os presos, estão médicos, policiais civis e militares, advogados e um sargento do Exército.

As clínicas ilegais mantidas pelas organizações criminosas faziam abortos em mulheres com até sete meses de gestação. Os preços variavam de R$ 1 mil (para maiores de 18 anos e em estágio inicial de gravidez) até R$ 7,5 mil (para adolescentes com 23 a 26 semanas de gestação).

O processo conta com depoimentos de 37 mulheres submetidas a procedimentos abortivos. Elas não foram indiciadas pelo crime de aborto, mas poderão responder criminalmente, caso esse seja o entendimento do Judiciário.

Cada grupo tinha um chefe e contava com responsáveis pelas mais variadas tarefas, como procedimento cirúrgico, auxílio de enfermagem, agenciamento das gestantes, segurança do local, medicamentos e transporte das usuárias do serviço clandestino.

Os servidores públicos investigados, entre eles oito policiais civis e quatro militares, seriam responsáveis por tarefas de segurança,  proteção da associação criminosa, administração das clínicas e transporte das gestantes. Além disso, recebiam dinheiro para evitar a repressão ou investigação dos casos.

Entre os crimes apurados, estão aborto (pena de um a quatro anos de prisão), corrupção passiva (dois a 12 anos), exercício ilegal da medicina (seis meses a dois anos), associação para o tráfico (três a dez anos) e associação criminosa armada (um a três anos).

Entre os dez médicos denunciados à Justiça, alguns têm anotações muito antigas por aborto. Um dos acusados, por exemplo, havia sido autuado pela prática em 1962. Uma médica, com processos desde 2001, é suspeita de mais de mil procedimentos.

Secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame informou que a operação de hoje deve servir para a rediscussão da legislação relativa ao aborto. “Acho o momento muito oportuno para as coisas sereem discutidas. Não vamos dizer o que a lei precisa fazer. Entretanto, a sociedade tem de conhecer o efeito que uma pessoa sofre ao praticar um aborto. É um problema nacional. Temos de acabar com o tabu e recolocar a discussão à mesa”, acrescentou Beltrame.

Acho que, com essa notícia, podemos entender muita coisa. Como funciona todo o processo por trás de um aborto ilegal feito em clínica no Brasil (aliás, no momento que escrevo esse post, passa uma reportagem na televisão falando sobre a operação, frisando as más condições de higiene dessas clínicas). E como manter esse processo na ilegalidade é lucrativo. Tanto que existe toda uma rede de profissionais envolvida, que ganha em cima da falta de amparo que as mulheres sofrem: médicos, policiais, advogados e etc. Vejam bem: UMA clínica chegava a lucrar até R$ 300 mil por mês, o que gera mais de R$ 3 milhões por ano. Sendo cada procedimento entre R$ 1 mil e R$ 7,5 mil, vamos pegar um valor médio de R$ 3500: esse valor significa mais de 80 abortos por mês em, repito, UMA CLÍNICA. Nessa operação, foram desarticuladas SETE organizações, mas claro que existem muitas outras espalhadas pelo país.  Ou seja, os números são muito, muito mais altos do que estes aqui. Então, olha, vamos combinar que não são apenas questões morais que emperram o debate, né!?

Em maio deste ano, o aborto legal entrou para lista de procedimentos do SUS. Isso facilitaria o processo, definindo exatamente qual seria o repasse do governo para os hospitais, entre outras medidas. Porém, pudemos comemorar este avanço por muito pouco tempo: uma semana depois, a portaria que previa a medida foi revogada. O Ministério da Saúde minimizou a questão (que não se sabe se foi causada por pressão de bancada evangélica ou a alegada “falha técnica”), dizendo que era apenas uma mudança burocrática e que o SUS já faz a interrupção da gravidez em casos permitidos pela legislação. No entanto, parte da luta feminista é justamente para colocar a burocracia a favor da mulher, oras. Quanto mais definição e amparo, sem deixar margem para interpretações subjetivas da situação por parte de profissionais que misturam crenças e opiniões onde deveriam ser neutros, mais avanço. Se você quer saber em quais situações o aborto é permitido ou tem outras dúvidas, clique aqui. Existem estimativas de que 1 milhão de abortos aconteçam por ano no Brasil. 

As mortes recentes veiculadas pela mídia de mulheres que foram interromper a gravidez em clínicas clandestinas (leia aqui e aqui), estão trazendo o debate à tona novamente e desmistificam a frase que diz que só mulher pobre morre por conta de aborto. Na verdade, nenhuma mulher está segura. Quem não tem dinheiro está ainda mais vulnerável e exposta à riscos, claro, mas as que têm condições de ir para uma clínica podem se deparar com falsos médicos, entre outros tipos de golpistas, e ambientes sujos. É triste a questão do aborto não ser tratada com a devida urgência.

(Leia: Óbitos em clínicas clandestinas de aborto estimulam debate sobre o tema)

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É preciso acabar com o mito de que facilitar o aborto é “liberar geral, uhu, festa do aborto”. Esse é um procedimento cirúrgico que envolve não apenas o corpo, mas o psicológico da mulher (embora existam as que não sintam culpa ou não sofram em relação ao assunto. Esse é um outro ponto importante também: mesmo quem é a favor do aborto ás vezes espera que as mulheres estejam sempre chorosas e arrependidas, quase como numa espécie de pedido eterno de redenção pelo ato). Aborto é questão de saúde pública. Não importa o que eu faria na minha vida pessoal, a sua religião ou o que o seu vizinho acha moralmente correto. O que importa é a escolha da mulher. Sim, o uso do preservativo deve ser estimulado, educação, planejamento familiar, etcetcetcetc (lembrando que nenhum desses itens é dever apenas da mulher, mesmo que muitos homens se isentem de responsabilidades). No entanto, mulheres engravidam e muitas vezes não podem (ou querem) ter filhos.

E outra, o contexto atual é: muitas mulheres abortam e morrem. De acordo com o DataSUS, o aborto inseguro é a quinta causa de morte materna no Brasil. Como não se importar com a vida dessas mulheres é ser a favor da vida? Como não é muito importante para a sociedade como um todo preservar a vida dessas mulheres?

Clique aqui para ver comparativo sobre as possibilidades legais de aborto em diversos países do mundo (em inglês). Muitos dos países que as pessoas adoram apontar como ~avançados~ e ~desenvolvidos~ estão com as barrinhas completas. Vamos torcer para que não demore para o Brasil preencher todas as barrinhas também.

Clique aqui para ter acesso a guia com 139 perguntas sobre aborto.

Clique aqui para ler “A questão do aborto”.

Clandestinas é um documentário sobre aborto no Brasil onde mulheres contam sua experiência interrompendo uma gravidez. Atrizes interpretam relatos reais.

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Grimes dá dicas para mulheres que querem (ou precisam) chefiar

A Tavi Gevinson – editora do fofíssimo site para adolescentes Rookie – vai lançar esse mês uma publicação editada por ela (“Rookie Yearbook Three”) que conta com a contribuição de diversas artistas sobre vários assuntos. A revista Elle publicou trecho de dicas dadas pela Grimes – ou Claire Boucher, artista canadense de vinte e poucos anos que começou a bombar em grande escala já faz uns três anos, produzindo as próprias músicas praticamente sozinha – sobre como ser chefe. São dicas simples, mas que achei interessantes por verem a dificuldade que muitas meninas e mulheres têm quando precisam se impor. E são dicas que valem não só pra quem é da música: se você vende comida de forma autônoma, elabora estampas e vende camisetas em loja virtual, gerencia alguma loja física, é fotógrafa, escritora ou tem qualquer outra relação com criação e/ou algum tipo de empreendimento, você vai precisar gerenciar serviços de outras pessoas. Por isso, traduzi (não sou nenhuma expert, perdoem qualquer erro) o texto, que vem a seguir. Aqui está o link original (em inglês).

Grimes, por Colin Kerrigan

Grimes, por Colin Kerrigan

Algo que eu não percebi quando comecei a fazer música foi que qualquer empreendimento empresarial envolve contratar pessoas, criar uma empresa e se tornar um empresário. Então, enquanto você provavelmente me conhece como artista, na prática eu sou também uma chefe. Sou a CEO de duas empresas, Grimes Creative Corp e Fairy Tour Corp, e acabei de começar a Roco-Prime Productions com o meu irmão. Isso é simultaneamente muito legal e muito estressante. Eu definitivamente não sou a melhor ou a mais experiente chefe. E sou também uma jovem chefe do sexo feminino, o que pode trazer um conjunto muito particular de desafios práticos e emocionais. Compilei aqui uma lista de coisas que têm sido úteis para mim enquanto venho tentando aprender como estar no comando, na esperança de que alguma delas possa ajudar qualquer uma de vocês que estejam fazendo o que estou fazendo (ou seja, “aprendendo enquanto faz”):

  • Você nunca vai ouvir tantas pessoas dizendo que você está errada quanto quando você está sucedendo. Depois que o meu álbum “Visions” foi lançado, eu gastei um tempo realmente longo enlouquecendo porque as pessoas estavam me dizendo que, para dar o “próximo passo” na minha carreira, eu precisaria me tornar uma “música” muito melhor, precisaria de uma banda de apoio, etc. Agora percebo que (a) nenhuma dessas pessoas têm carreiras musicais e (b) eu desperdicei muito tempo tentando fazer coisas que me disseram que eram “importantes para todo músico profissional”, sem perceber que, enquanto fã, eu sempre fui muito mais interessada em coisas que eu nunca tinha visto antes. O ponto é que escutar os haters é inútil. As pessoas julgam tudo – muitas vezes porque se sentem ameaçadas. Ignore-as. Acho que isso se aplica a todo negócio ou coisa criativa, porque o mundo de amanhã não vai se parecer com o de hoje. Fazer algo diferente é provavelmente melhor do que fazer as mesmas coisas que as outras pessoas fazem.
  • Pule corda. É a forma mais eficiente de obter exercício cardiovascular em qualquer tipo de clima, sem ir à academia. Exercícios são muito importantes se você está lidando com depressão ou raiva – e qualquer trabalho na indústria do entretenimento causa ambos.
  • Pare de trabalhar quando você estiver cansada – mas não fique com preguiça. Eu às vezes oscilo entre trabalhar 22 horas seguidas, entrar em colapso e perceber que eu não tenho que aderir a um horário fixo, e assistir todos os episódios de Os Sopranos. Eu não sugiro este sistema. Horários planejados são surpreendentes: oito horas de trabalho, oito horas de sono. As outras oito horas são de uso livre (ainda não sou mestre nisso, mas quando consigo botar em prática me torno muito mais produtiva).
  • Agarre-se em seu trabalho. Certa vez, Elvis Presley quis gravar um cover de “I Will Always Love You”, da Dolly Parton, mas com a condição de que metade dos royalties de difusão – dinheiro que o compositor recebe sempre que alguém toca ou performa sua canção em público – ficassem pra ele. Dolly disse que não e, muitos anos depois, Whitney Houston cantou “I Will Always Love You” em um filme, e essa provavelmente se tornou uma das canções mais memoráveis ​​(e lucrativas) de todos os tempos. Portanto, é muito importante manter a posse de sua propriedade intelectual. Coloque direitos autorais em tudo. NÃO SE ESQUEÇA DE FAZER ISSO. Você pode se ferrar de tantas maneiras se não reivindicar os direitos autorais de seu trabalho. Por outro lado, trate seus colaboradores com respeito e dê a eles o dévido crédito.
  • Seja gentil com as pessoas que trabalham com você. É de extrema importância tratar as pessoas com gentileza, porque você quer que elas trabalhem com empenho e se preocupem com as coisas que vocês estão construindo juntos. No entanto, para que as coisas sejam feitas, às vezes você precisa ser má. Eu sou muito ruim nisso, mas é absolutamente necessário que as pessoas saibam quando algo é inaceitável, ou elas vão continuar fazendo isso e você vai ficar ressentida, o que irá gerar vibrações ruins.
  • Leia/assista biografias de pessoas que você admira. Eu aprendi mais com esta prática do que com qualquer outra coisa, sério. Além disso, se você está perto de alguém que faz o que você quer fazer, faça perguntas e veja de perto o trabalho da pessoa.
  • Bette Midler disse uma vez: “acredito firmemente que com um calçado adequado, se pode governar o mundo”. Eu costumava tentar usar saltos, e foi um desastre. Agora sempre priorizo sapatos confortáveis. Além disso, evite usar branco: pessoas ocupadas não têm tempo para trocar de roupa com frequência, e branco suja rápido (a menos que você seja Olivia Pope). Basta encontrar uma ou duas roupas que pareçam legais e que você possa também dormir com elas.
  • Evite namorar com alguém que faz o mesmo trabalho que você. Se você acabar fazendo isso, certifique-se que a pessoa não ressente o seu sucesso e nem você o dela.
  • Tente namorar com uma pessoa que seja boa na cozinha. Isso vai poupar tempo.
  • Se você está cansada e precisa ser enérgica, beber um pouco de molho de pimenta realmente funciona.
  • Mantenha caneta e papel ao lado de sua mesa de cabeceira. Boas ideias muitas vezes surgem quando você está caindo no sono, e você não vai se lembrar delas de manhã.
  • Só porque alguém tem mais qualificações do que você não significa que essa pessoa é melhor do que você. Vivemos na era da tecnologia, então você pode googlar tudo que não souber fazer. A única coisa que você não pode googlar é como ser original e criativa. Seus pensamentos têm mais valor do que um diploma ou pai/mãe no mesmo campo de atuação ou qualquer outra coisa. Sempre penso no meu avô, que se tornou um engenheiro com apenas a sétima série concluída. É uma coisa muito clichê de se dizer, mas quase tudo é possível se você programa sua mente pra isso.
  • De verdade, a coisa mais importante é eliminar a falta de confiança em si mesma. Isso é basicamente impossível para mim, mas descobri que se eu agir como chefe, eu posso me convencer de que eu sou uma chefe quando preciso ser uma. Copio coisas que já vi políticos e atores fazendo; faço contato visual com as pessoas; tento manter os ombros para trás e cabeça erguida; gesticulo e, por vezes, faço longas pausas (silêncio pode ser muito intimidante). Tento agir como se eu fosse poderosa, no palco e fora dele. Sou, muitas vezes, tratada com desrespeito, mas respondo da forma mais respeitosa que eu puder, porque quando você não tropeça, isso faz com que os trolls pareçam estúpidos. Conforme o tempo vai passando, tenho notado que as pessoas ruins foram gradativamente sumindo e estou cada vez mais cercada por pessoas que confio e que compartilho respeito mútuo – o que, por sinal, gera confiança real.

Já que estamos falando da Grimes, uma curiosidade que se encaixa com o tema do post: o clipe acima foi feito com pouquíssimo dinheiro e dirigido por ela mesma:

Esse foi um vídeo com verdadeiras influências K-pop. O orçamento, de $60, foi todo em álcool. Nós literalmente planejamos ele na noite anterior. Eu só reuni algumas amigas para beber muito e foi tipo “nós vamos fazer movimentos de dança”. Fizemos o vídeo em algumas horas. Eu quase não me importava em como o vídeo ficaria; só queria que parecesse que todo mundo estava se divertindo. Eu queria também que fosse um pouco assustador, por isso tem o lance das coisas pra trás.

(Trecho retirado dessa entrevista – em inglês)

E você aí? Esperando o quê? Junta azamiga, estufa o peito, pede ajuda no que for preciso e tira do papel aquele plano que você achou que nunca daria certo! Se você já toca algum projeto, muita força e continue assim. O mundo também é nosso! ❤

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Pensamentos soltos sobre jornalismo, mercado & mulher

Oi, gente! Antes de começar o post, gostaria de agradecer quem tem lido, compartilhado e debatido os assuntos que me proponho a falar sobre. Este blog é novinho e ainda está engatinhando, mas teve semana que conseguiu alcançar mais de 20 mil visitas – considero bastante para algo totalmente independente e divulgado no boca a boca, e fico feliz. Eu já fui muito insegura para expor minhas ideias ou mostrar o que escrevo, e é incrível e surpreendente viver nesse tempo dinâmico, de feedbacks imediatos.

E baseada nesses feedbacks, venho prosseguir a discussão sobre mulheres e mídia iniciada neste post aqui. Uma jornalista se incomodou com o fato de eu colocar a culpa de matérias machistas nas costas de nossos (opa, pra quem não sabe: também sou jornalista) colegas de profissão. Parte do comentário dela foi o seguinte:

“Cara, quem alimenta essa indústria dos cliques não somos (só) nós. É um círculo vicioso! Se não houvesse tanta procura – algo que eu queria entender – certamente nossos veículos e diretores não investiriam tanto na produção de conteúdo sobre ‘celebridades’ e derivados”

E ela tem toda razão. Jornalistas não são os únicos culpados, embora eu quisesse dar uma cutucadinha na consciência deles quando falei que deveriam tomar vergonha e ir estudar mais. No jornalismo online, por exemplo, existe uma “indústria de cliques”, como a jornalista disse, que busca atenção rápida e a certeza de que o link será aberto. Quanto mais cliques, mais anúncios. E os anunciantes não parecem muito preocupados com a procedência dos cliques (tem muita matéria ~polêmica~ que rende clique e gera impacto negativo nos leitores – só que, no fim, a marca vai grudar na cabeça e todo mundo vai acabar consumindo de qualquer jeito).

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Ilustração de JoHee Yoon

Conteúdo interessante também atrai, mas os profissionais, em geral, não possuem tempo para procurar boas pautas na rua ou para pesquisar um assunto profundamente. Os prazos são apertados, a demanda por novidades constantes é alta e existem mil tarefas a serem cumpridas ao mesmo tempo, virtualmente e offline. Além do mais, muitos anunciantes de veículos voltados para mulheres são das indústrias de cosméticos, vestuário e etc, o que estimula a criação de necessidades antes inexistentes. Novidades relacionadas a roupa, cabelo, maquiagem e cirurgias plásticas, por exemplo, são mostradas a todo momento não apenas em propagandas, mas nas próprias matérias que saem em sites, revistas, suplementos de jornais ou programas televisivos. Porém, não sei até que ponto isso é “proposital”, numa tentativa de criar tendências, e até que ponto é uma mera assimilação desses produtos e práticas como pertencentes a um suposto “universo feminino” (pretendo fazer, em breve, um post sobre o surgimento da chamada “imprensa feminina”, o que nos ajudará a pensar essa questão). Aliás, nós, mulheres, somos consideradas um público emergente e valioso, com as recentes reconfigurações econômicas e familiares (mães solteiras e chefes de família, por exemplo).

No entanto, acredito que existe também um olhar viciado e preguiça de sair da zona de conforto por parte de alguns jornalistas, e isso faz com eles se ancorem em pontos de vista rasos e em “achismos”. Muitos não conseguem se despir dos próprios preconceitos e acham ok reproduzir o senso comum, ao invés de tentar entender minimamente o outro e suas especificidades, e desmistificar ideias correntes mas nem sempre corretas.

A nota sobre o envelhecimento de Liv Tyler, por exemplo, poderia muito bem ter sido só uma besteira do tipo “Fulana de Tal toma banho de mar”, que é o cúmulo do dizer nada, mas pelo menos não perpetua padrões negativos – e atrai o mesmo tipo de atenção. Isso entra, aliás, em uma outra questão, relacionada a um comentário que também recebi. Comentários, na verdade, pois foi um ponto abordado mais de uma vez: entretenimento e fofoca na internet não é jornalismo.

Hm. Essa questão é complicada. Claro que notas sobre envelhecimento e banhos de mar não são o jornalismo em sua forma “tradicional”. Mas constituem um híbrido entre jornalismo e publicidade onde a “informação” (ou falta de) constitui a própria mercadoria. “O infotenimento é hoje a grande sacada empresarial dos meios de comunicação para alavancar suas vendas e não perder seu público. Mas até que ponto misturar informação e entretenimento pode prejudicar a real função do jornalismo? Que hoje a informação jornalística é considerada uma mercadoria, não há dúvida, mas como é possível, em meio a esse turbilhão de informações, separar o joio do trigo, ou seja, aquilo que realmente é informação daquilo que é apenas distração, fruição?”. 

Eu não sei bem a resposta, mas sei que o tal do infotenimento, muitas vezes, tem status e alcance de jornalismo (mais, até). E vários veículos misturam tudo (notícias, entretenimento, etc), o que dificulta o discernimento do leitor comum (digo comum no sentido de não-jornalista e tal), que tem o hábito de dar (ou não) credibilidade para um veículo como um todo. Então… É algo que deve sim ser analisado. Se uma mensagem está sendo passada, um monte de gente está recebendo essa mensagem. E acho que o jornalismo “tradicional” e o infotenimento se retroalimentam, formando um ciclo que perpetua as mesmas ideias, mas em diferentes níveis.

No infotenimento, os absurdos são mais escancarados (“VEJA O BUMBUM DA CICRANA CHEIO DE CELULITE”), mas o jornalismo “tradicional” não fica atrás. Quantas não foram as matérias que já lemos ao longo da vida falando sobre aparência de mulheres que atuam na política, sobre inovações estéticas que vão ~levantar a auto-estima~ das mulheres, sobre a manifestante “gata”, sobre como o corpo de mulheres esportistas é magro demais, grande demais ou forte demais, entre outras? Quantas não foram as reportagens que tentaram naturalizar a “inferioridade” da mulher ou demonizar conquistas femininas, com apurações dignas de infotenimento, e não de jornalismo “tradicional”?

Não tenho conclusões definitivas. Até porque mulheres são maioria entre jornalistas, mas grandes empresas e veículos costumam ter homens no poder. O olhar por trás das decisões é masculino. Então essa postagem é mais um rascunho, um espaço para escoar as ideias que surgiram sobre o assunto após o post anterior. E um convite à reflexão sobre quais as posições de cada peça nesse grande jogo que é o recorte de interpretações do mundo por meio de produção e disseminação de informações. Vamos pensar juntos?

Ah, fiz uma página no Facebook: www.facebook.com/revolucaovulva 🙂